Fragmentos

..o que não deve ser esquecido.

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20140401

Tempo Rei

Vossa Alteza

A Implacabilidade de Chronos


Chronos, dono de tudo. Transformador do Céu e da Terra. Corre neutro e vetorialmente implacável, longe de qualquer controle racional.
Tudo o que você aprende, seus caminhos e experiências, todas suas paixões e as pessoas que aprendeu a amar: tudo que tange o vetor do tempo, o pertence.

Somente a essência parece permanecer,  quando todo o resto, preso na existência, parece estar fadado a perecer. 

Memórias são as máculas da passagem do tempo, como o tecido branco que se amarela ou as nódoas de fruta ou tinta ou café que se recusam a deixar a malha mesmo depois de muitas lavagens. São com registro-cópia do doloroso contrato que fazemos, inconscientes, mesmo antes de nascermos, com Chronos: o contrato do perecível, do efêmero e do breve; da perda.


 Lá na memória, onde pode morar tanto a ternura quanto o arrependimento, temos a certeza de que tudo pertence ao tempo. 

Em nosso perecível invólucro de carne, prendemos nossa essência imortal.
Chronos passará e apodrecerá sua carne, a essência sobreviverá. Manchada de lembranças de toda forma e cor, será blindada contra a ação do tempo, e selada junto ás almas de quem compartilhar dessas manchas.

Tudo que o tempo dá, o tempo tira. O tempo pode trazer de volta, ou cessar permanentemente. O tempo, vetorial, faz-se rei indo e mostrando a vida em ciclos, talvez, como uma faísca de esperança, um afago misericordioso. Ciclos da vida, de mudanças, transformações. Como o dia entra no amanhecer e a 
lagarta se metamorfoseia em borboleta, o migrar dos pássaros, o murchar das rosas. Todo fim é um rito de passagem e transformação.  Por isso, nem toda perda é ruim. Perdas são importantes, principalmente quanto mais se importa. Nos ensina a ser humildes, despidos de soberba e ganância, vulneráveis, saindo da casca como um animal trocando de pele. Perder aquilo que.......nunca, nunca nos pertenceu. Seria então realmente tirar algo do inteiro?

Pronomes possessivos: Diga-me agora tudo o que te pertence. Comece pelos bens materiais: eles serão os primeiros á sofrerem a ação do tempo. Inclua seu invólucro de carne, seu corpo físico, que apodrece tão rápido quanto for ruim seu trato para com o mesmo.
Diga-me o que possui, que não podes tocar: sua personalidade, opinião, preferências, conhecimento, experiências, sensações, sentimentos, sinestesias e sínteses: tudo pertenceu àquele momento fixo no vetor do tempo, impossível trazer de volta. Acene para eles como se assistisse à  uma pedra que se afunda no rio da memória, os segundos vividos não podem ser tragos de volta, desaparecem como bolhas de sabão que vão flutuando até estourar. O brilho perolado e o arco-íris capturado, dura pouco mais de alguns segundos. É uma lição sobre a efemeridade: "o eterno é breve". 

Aqueles segundos, momentos que jamais voltarão, mas que nos deixam nostálgicos pois, como fotografias instantâneas, ficam armazenadas - uma cópia-fantasma, intangível - nas nossas mentes, que com o tempo podem moldar ou enfeitar ou enfeiar essas fotografias conforme lhe convier. 
A marca da efemeridade, assinatura do chicote de Chronos, sempre presente.

O tempo é REI, e subjuga todo deus à categoria de mito, pois toda glória que trouxer um dia, certamente levará consigo. 

A Morte, aliada.


Mais uma marca do tempo ou a unica deidade a nunca ser subjugada. A Morte é o rito de passagem, de transformação. Todo novo começo precisa de um fim, assim se fecham os ciclos. É necessário o sacrifício, o desprendimento, para que Chronos traga novas. Ou a repetição. A repetição como a obsessão por vida eterna, uma forma de subjugar Chronos e recuperar tudo que um dia ilusoriamente "pertenceu" á você, a todos nós, seres com consciência, capacidade de julgamento crítico.

Mas por que rejeitamos a Morte? Por que queremos domar Chronos, o indomável?

"Quando você está vivo, a morte não existe. Quando a morte chega, você não existe mais." -Ninfomaníaca, Parte 1


Queremos ser eternos. O velho deus-sol, inabalável. Eternos, imortais, compartilhando da taça de Chronos a preciosidade: tempo. 
O eterno torna os momentos menos preciosos. A vida é preciosa pois é rara e curta. Os momentos não voltam. O tempo não rebobina. É um fardo pesado de tranquilidade: o tempo vai passar. 

O que passa, se transforma, deixa de existir como era, passa a ser outra coisa. 
Isso pode ser um milagre ou uma maldição. Temos medo do que muda, do que parte, do que deixa de ser...  mas não possuímos nada, não somos nada. Tudo é tempo. E o tempo é Rei.

[....continua...]

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